domingo, 7 de março de 2010

Caráter do enunciador: o ethos

  A análise da carta renúncia foi fundamentada nos pressupostos teóricos na construção de um Ethos ditado pelo ex-presidente Janio Quadros em 1961.
 Observa-se que o enunciador aparece no discurso em primeira pessoa, ou seja, o próprio Jânio Quadros. Contudo, para entender como o ethos  do sujeito enunciador está construído nesse  discurso tem-se que analisar a cena de enunciação, “o ethos e a cenografia são construídos,ao mesmo tempo, pelo interlocutor, que não somente decodifica o sentido de um texto, como também participa “fisicamente” do mesmo mundo que o fiador. Assim, o co-enunciador captado pelo ethos de um discurso está implicado em sua cenografia” (Maingueneau)”
Nesta carta renúncia as cenas de enunciação são diversas, Jânio fala a seus locutores como homem do povo, como homem experiente, como trabalhador etc. 
“Fui vencido pela reação e assim deixo o governo. Nestes sete meses cumpri meu dever. Tenho-o cumprido dia e noite, trabalhando infatigavelmente, sem prevenções, nem rancores.”
         Percebe-se neste exemplo, o uso da primeira pessoa do singular que marca o sujeito “no lugar” de  Presidente da República. O enunciador constrói uma imagem de trabalhador incansável que cumpriu o seu dever e que fez tudo isso por prazer, sem nenhum arrependimento.
         Num outro trecho, o enunciador fala “no lugar” do nacionalista:  “Desejei um Brasil para os brasileiros afrontando, nesse sonho, a corrupção, a mentira ...”  O efeito de sentido conseguido no uso da primeira pessoa é que o enunciador é um brasileiro sonhador como qualquer um, que deseja viver num país melhor livre de corrupção e de mentira.
         Em outros momentos de seu discurso Jânio faz uso da primeira pessoa no plural. Verifica-se na carta renúncia que o enunciador se utiliza do nós inclusivo, em que se fundem o eu e o você.
       Observa-se que o locutor ao usar  nós no texto em questão se apresenta  como parte de uma coletividade e atua em conjunto com ela. A imagem dele é construída com base na defesa de que somente pessoas respeitosas, ordeiras e trabalhadoras é que são dignas do Brasil.
Quando o  enunciador desqualifica  o seu adversário está ao mesmo tempo construindo sua própria identidade, pois  de forma implícita, atribui para si às qualidades que os outros não possuem, construindo uma imagem que deseja legitimar para si mesmo.
         Ao analisar o locutor  no discurso consiste não em ver o que ele diz de si mesmo, mas em conhecer a aparência que lhe conferem as modalidades de sua fala, ou seja, como o locutor constrói a imagem de si mesmo no discurso. Pode-se concluir que o discurso de Jânio Quadros  mostra em suma  o ethos de homem honesto e trabalhador  que se preocupa com o povo, alguém que tem sensibilidade política e é conhecedor da nossa sociedade. 


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